Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Marcos Resende Amigos

Marcos Resende Amigos

Oreste M.Regispani - Monólogos Com Sentido de Diálogo

Abstrato 19.jpg

Índice Amigo ◦ Índice Geral

 I.

LUDWIG, QUARTETO OP. 135
Es muss sein!  It must be!

Assim tem de ser: as belas mãos e teus belos...
Belos são todos os teus olhos
Junto com as mãos a voz e os zigomas
harmônicos encornijam sorrisos
Dentários, incisivos, labiais que
Aleijadinho algum, por barroco que fosse
Em madeiras escolhidas jamais fez,
Dourada e reluzente, tão nobre, tão gente:
Tua atmosfera incandescente

II.
AS FALAS
É preciso!

Assim tem de ser. As falas
Que não dizes, tão mais sóbrias
Do que as que dizes.
O texto do poema jansenista traz-me à baila
Da memória otimista;
Viscoses, moletons e um esporte que jamais joguei,
E de que para viver livre não precisei...
É preciso tua fala extraída à revelia,
Uma kodak qualquer — todas as máquinas são kodaks.
E não reagirás à luz do sol, nem aos flashes
A diafragma que sela para sempre o instante
No infinito, que afinal de contas, não será tão
Tão infinito quanto o amor que dure.
Tua frase não saiu na foto.
Muss es sein? Era preciso?

III.
ANTES QUE ACABES
O calor do teu calor,
O agridoce do teu sabor chocolate
Com amêndoas tostadas, purificador
Chocolate de dor. Conheço o amparo da tua
Substância oral — o amor é oral
Antes de ser fala corporal. O beijo
Vem com o desejo: tudo é preciso,
Tudo, até tua foto muda,
Antes que tudo acabe.

IV.
ANJO NOCTÍVAGO
Sei ser teu anjo

E finjo como bom  pastor,
Se o poeta é um medíocre fingidor:
Um arcanjo de pedra que destila
Orvalho, chora de verdade lágrimas
De crocodilo. Grandes e sinceras.
A busca da noite
Desolada, não secreta e incerta talvez.
Num restaurante discreto, não o lugar
De lá sentar, é a busca de buscar, ou a noite.
Seja como for, "teus lábios têm mel",
Pensas mas não sabes... Vai depressa, acompanha-te,
Busca uma esfinge qualquer, mas pode ser escolhida a dedo,
Mas que seja qualquer,
Antes que a noite acabe,
E o anjo se recolha.
Na noite seguinte, não sei ser mais
Teu anjo antigo. Tu, beija-flor
Sempre contigo; alguém ou teu anjo
Peralta das ruas vazias, espírito que também sonha
Sem corpo, imodesto, sempre só consigo...
Assim tem de ser,
Antes que acabes comigo.

V.
JOGRAL DE ESPELHOS
Teu estranho ser, teu sorriso,
Teu corpo que não existe,
Perambula solto, aos saltos mortais
E sobressaltos — e não se excita com a verdade,
Que esta é um espelho estilhaçado
Quase sempre como Tonio Kroeger, como Hesse
E as fotos de Mapplethorpe,
Reflete mal e não reflete o todo.
Num bosque antigo ou numa noite,
Desliso as mãos sobre tua foto. Estamos
frente a frente com lente acesa; ficou parada
No ar a luz, como o pensamento
E o pomo hióideo! 

VI.
PARÊNTESES
(Uma noite de outubro de 1826, havia um quarteto de cordas comigo.
E outros misteriosos sentimentos.
Pelo amor de Deus, ao menos, ouçamos com respeito
O que os ouvidos ouvem... Ou não ouvem mais?)

VII
HIPÓTESE
Censurei-me a foto,
A noite e o sorriso pergaminho, herético
E o gesto ateu, erótico, lascivo, não;
Não eu, mas a foto restou
Como o imóvel de um crime.
desesperadamente passional e futuro.
Assim tem de ser. Comigo,
Contigo, e com a kodak,
Que ainda não aprendeu a falar,
Somente presta atenção e faz tudo calar.
Tua frase não foi revelada,
Nem ampliada... Não sei sequer
Se foi pensada. Poderia sim, ter sido,
Antes que o tempo com tudo acabe. 

Para
                         Argemiro Procópio Filho
28.07.1991


Índice Amigo
 ◦ 
Índice Geral

Amigos

  •  
  • Pesquisa:

     

    Marcos Resende