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Marcos Resende Amigos

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Juca Silveira - O Exterminador de Jabutis

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Corria 1981. Ditadura militar em decadência, mas ainda ditadura. Brasilia, minha nova morada. Eu, frangote de 25 anos, havia sido contratado para gerenciar a TV Nacional — da estatal Radiobrás, pelo Diretor de Programação, Produção, Operações e Engenharia da época, um coronel da reserva. Governo Figueiredo. Meu diretor era um cara muito preparado, culto, que gostava de música e cinema, enfim, uma boa figura.
Na Radiobrás encontrei muita gente boa, excelentes profissionais que se tornaram grandes amigos até hoje e que me ajudaram a amenizar a falta que me faziam família e amigos que deixei em São Paulo. Muitos reencontrei agora, através desse facebook. À época, eu e Cris já tínhamos um filho de menos de dois anos e outro a caminho. 


Me divertiam muito na Radiobrás — e em todo o governo, a enorme quantidade de siglas que os militares haviam criado pra absolutamente tudo! Era ASJU, COCAL, ASPRO, ADGER e a obvia PRESI. Tudo tinha sigla. Eu era o GERTV. Havia uma sinistra ASI, assessoria de informação, ligada ao SNI, com uns arapongas macambúzios que mal davam bom-dia. O Presi da Radiobrás era um general da reserva, amigo do peito do Presi da República, e frequentava os churrascos de fim de semana na Granja do Torto. 

O DIPRO (meu diretor) me entupia de “missões”, como ele gostava de chamar, na linguagem dos militares, os projetos de que me encarregava: — “A tua missão é criar um programa que abra espaço para os músicos de Brasilia!... É por aí a guerra...” Eu botava minha querida “tropa” pra jambrar, Roberto Rosemberg à frente, e rapidamente começamos a produzir o Espaço, apresentado pelo Claudio Lessa. Pelo programa passaram craques como a Cássia Eller e a Zélia Cristina, hoje Zelia Duncan, além de muitos outros ótimos músicos do Distrito Federal. Quem dirigia era a adorável Lucia Parreira, e a Aninha Evelin começou sua carreira ali. Katia Maranhão também chegou nessa época, estreando como apresentadora na TV Nacional. E outras “missões” do DIPRO vinham a galope, não havia uma semana de paz. Trabalhávamos feito mouros, mas eu estava bem feliz e — já workaholic, enlouquecia todo mundo, a começar pela Deogracia Pinto, minha querida secretária da época. Engraçado também era ser chamado de doutor, imaginem! Todo mundo em Brasília que tivesse um carguinho pequeno que fosse, já era tratado por “doutor”. 
— “Doutor Juca, o Doutor Fajardo quer marcar reunião com o senhor”. —“o Doutor Marcinho Lacombe está na linha...”

Mais à vontade depois de uns dois meses de trabalho e vendo que o DIPRO gostava de mim, arrisquei propor a ele uma mudança de grade, tentando consertar o que pensava ser meio absurdo: havia na TV Nacional um programete de 5 minutos, chamado Ponto de Vista, exibido imediatamente antes do Jornal da Bandeirantes, com o qual fazíamos rede. Mas não era uma transmissão simultânea, real-time. O Jornal da Bandeirantes era gravado bloco a bloco e reproduzido na nossa grade cerca de dez ou quinze minutos depois de ter sido exibido nacionalmente. Um procedimento inexplicável. Ponto de Vista era um editorial chatíssimo, escrito num linguagem gongórica, rocambolesca, quase incompreensível. E atrasava a entrada do jornal... Por certo, derrubava a audiência, eu pensava... Iria propor ao DIPRO que trocasse o jornalista que escrevia tão mal e pusesse o Ponto de Vista em qualquer lugar, menos ali. Lá fui, com meu ovinho de Colombo...

Eu: — “DIPRO, esse Ponto de Vista é muito mal redigido... pode ser que quando escrito faça algum sentido, mas quando falado é um horror, precisamos de outro redator... E mais: além do apresentador ser feio pra caramba, o PV atrasa a entrada do jornal de rede e torna toda a operação "grava e exibe em seguida" muito arriscada... Vamos mudá-lo de posição na grade?”

Ele, o DIPRO: — “Mas quem escreve o Ponto de Vista é o PRESI !! Você não gosta? O editorial está lá pra marcar a posição do Governo, antes que o jornal de rede comece. Não posso mudá-lo de lugar. O jornal de rede vai gravado pra que possamos cortá-lo, caso haja alguma notícia desfavorável ao Governo...”

Gulp! Saí de mãos abanando, cara de tacho e achando que seria demitido nas próximas horas... No mesmo dia, contei a história ao DAFIN (Diretor de Administraçao e Finanças), civil, que também simpatizava comigo e me ajudava bastante nas “missões”. Ele, rindo muito, ensinou-me valiosa lição:

— “Meu filho, em Brasilia, quando você vir um jabuti em cima de uma árvore, não queira tirá-lo de lá. O bicho tem dono... Jabuti não sobe em árvore...”  Aprendi rápido a reconhecer jabutis e jabotas e mais tarde, em 85, eu mesmo cheguei a ser o DIPRO da Radiobrás e pude acabar com o PV por minhas próprias mãos. Mas essa é outra longa história, que fica para uma outra vez...

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14.01.2012

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