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Marcos Resende Amigos

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J. Antônio D'Ávila - Pastor de Temporais

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A ROSA DO SEXÁGENO

Sessenta violoncelos
solenes
violoncelando.
Sessenta lembranças de um nome
prendido à garganta e à memória.
A Rosa do Sexágeno a quem eu devo ofertar?
Testamenteiro, atento!
que se leia o testamento
com um solo de cavaquinho,
de Pixinguinha, o chorinho —
Lamento.

PRAIA NOTURNA

Na praia noturna tudo se clareia.
Um trovão,
navalha de luz na barriga do mar:
— Yansã!  Epa hei!  Epa hei, Yansã!

Abençoados os negros,
pois nos trouxeram deuses.

ONTENS

No tempo tranquilo em que havia ontens
O recente era uma pacífica propriedade
à espera submissa de ser cancelada.

Teu sorriso,
tua meiguice,
tua entrega,
eram meu poder.

ANÚNCIO CLASSIFICADO

Precisa-se
de um amor de segunda mão
em perfeito estado
para ser amado
tranquila e profundamente.

Pede-se encarecidamente:
por simples curiosidade
não se apresente.

Precisa-se de amor.
                 Verdade.
Não é um truque publicitário.
Trata-se de alguém extremamente necessitado
de amor.
Alguém sofridamente solitário.

É que só quem amou um amor mal amado
pode entender que se procure amor
com um anúncio classificado.

AEROPORTO

No aeroporto interplanetário
do satélite L-13-B-45
uma voz anunciou:
— Senhores passageiros para a lua
queiram apagar suas estrelas
e podem sonhar!

CANTO A ALLENDE

Estou voltando de Pasárgada.

A CIA passou por lá.

Sou um homem do terceiro mundo
mas meu coração não é.

CADERNETA

Esta caderneta de endereços, desabando folhas,
capa despregada, cores diversas de tintas várias de canetas perdidas.

Trágica e engraçada
minha caderneta de endereços.
Amadas que se mudaram,
Amigos que não estão.
Banqueiros que não atendem.

De quando em sempre a voz de secretárias:
— Queira desculpar, estão em reunião!

Esta caderneta é
o Guia internacional dos homens em reunião.

Caderneta doida que é o meu retrato:
vida sem endereço.

O ANJINHO DA PROCISSÃO

O anjinho da procissão vai tão triste
com asas mal ajeitadas, pregadas na camisola.
— Que bom vai ser, quando a gente grande
parar de fingir que é boazinha
e a procissão acabar.
Vou correndo pro quintal matar passarinho!

ANGÚSTIA URBANA

Em frente
à minha janela
os homens colocaram

PEDRA
SOBRE
PEDRA

e roubaram meu crepúsculo.

ONDE?

Em que canto de rua,

pedaço de praia,
terreno baldio,
capim de roça,
ladeira vadia,
grama de várzea,
pátio de fábrica
— onde?

Onde estão neste instante
os pés que amanhã,
nascidos anônimos,
serão pés de herois
com apelidos humildes —
garrinchas, pelés?

DUPLICATAS

Estranho mundo esse das duplicatas,
das notas de fornecimento,
dos cheques cruzados, visados.
Bizarro e caricato mundo.

Nele, as assinaturas
são senhoras suspeitas
levadas às delegacias
para provarem que são senhoras direitas.

Um documento para ser legal,
quer queira, quer não,
necessita do visto do tabelião.

Sufoca-me esta pequena vida.
Ter que levar papeis
ter que mostrar meus versos,
minhas emoções,
para receber o carimbo:
FIRMA RECONHECIDA

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