Edison Braga - Coração aos Pedaços
Um dispositivo camuflado no interior do sutiã fazia da dançarina árabe uma ameaça mortal aos incautos frequentadores daquele cabaré. Pudera! Enquanto dançava, seus seios, a todo instante, tocavam a engenhoca. A pobre “sexi-bomb” desconhecia o poder de destruição que trazia junto ao peito. Helga Mustafá não sabia que, num passo de dança, poderia explodir literalmente aquele lugar. Tudo era um plano do enciumado DJ Ahmed Kaled Amin. Quando ele tocasse “Stars Frenetic Lights”, faria com que Helga executasse um movimento com os seios que... Bum!
Ainda era cedo e o cabaré não estava cheio. Ahmed esperava ansioso e colocava apenas músicas lânguidas e inofensivas enquanto ia acumulando seu ódio ao antever o massacre. Amor e ódio. Esses foram os sentimentos que o levaram a engendrar a matança. Ahmed amava a prima Helga e ela lhe negava um mísero olhar de carinho. Apesar de viverem na mesma miséria, no mesmo sórdido lugarzinho ao pé das colinas de Golam, Helga se sentia superior desde quando eram crianças, apenas por possuir um tiquinho de sangue alemão nas veias. Ahmed não entendia o motivo da “superioridade”. Só porque a avó de Helga se deixara possuir por um soldado das tropas de Rommel? Está certo que era um tipo bonzinho, romântico, tão honesto que antes de sumir, fez questão de dar o nome da própria mãe àquela cria. Também, mais ele não poderia ter feito. Talvez até tenha morrido quando as tropas alemãs foram atacadas... A avó de Helga nunca teve notícias.
Depois, a primeira Helga cresceu e concebeu uma nova Helga: uma estranha mulher árabe, de ancas largas, cabeleira negra, boca carnuda debaixo do nariz da raça e olhos muito azuis. Essa mesma que aí está, prestes a explodir...
Ah, a explosão! Quando Ahmed decidiu matar a prima, ele percebeu que não ficaria satisfeito em liquidar apenas com Helga. Ele queria um banho de sangue. Por isso espalhou uma quantidade enorme de bombas no cabaré. Junto com Helga iria pelos ares uma centena de infiéis. É claro que o bom dinheiro que recebeu da organização foi um grande incentivo. Ahmed sorriu ao lembrar a cena que fez ao lhe oferecerem a macabra propina. Fingiu que não queria aceitar, que daria um jeito para comprar o material e depois fugir. Só não se oferecia como suicida porque pretendia ajudar a causa em outros atentados, mas simularia a própria morte para melhor agir no futuro.
Mas, Ahmed esperava uma pessoa em especial. Aquele que lhe roubara o coração de Helga. Aquele a quem Helga se entregara como uma jumenta do deserto. Ahmed esperava Janailson, o centroavante brasileiro do time do príncipe Muhad dos Emirados Árabes.
Ahmed e Janailson tinham sido amigos. Hoje apenas o brasileiro acredita nisso. Fora o próprio Ahmed que apresentara Janailson à prima Helga. O príncipe encarregara Ahmed de proteger Janailson em troca de polpudas gorjetas e daí nasceu a amizade. Ahmed jamais poderia supor que Helga se interessasse por Janailson. Afinal, apesar da cor dos cabelos, Janailson era negro! Um sarará, como ele próprio se definia, em meio a gargalhadas bêbadas. Helga, apesar do oitavo de sangue alemão, se encantara por aquele mulato louro vindo de um lugar chamado Recife, banhado por um par de rios que nunca conseguia lembrar o nome. Janailson foi a perdição de Helga. Bom de bola, mas melhor ainda de copo e de noitadas, Janailson logo caiu em desgraça junto ao príncipe. Depois de pedir socorro à amante tornou-se seu cafetão, coisa que raramente existia por aquelas bandas.
Ahmed odiava aquele sarará dos infernos e quando o viu entrando no “Oásis Dançante” logo separou o cd mortal enquanto acenava para o brasileiro. O plano era simples. Pediria para que Janailson o substituísse por alguns instantes, enquanto que ele, fingindo que ia ao banheiro, escapulia dali. Antes, recomendaria que tocasse o “Stars Frenetic Lights” para “agitar” o ambiente...
Janailson caminhava ao encontro de Ahmed, quando Helga pulou do pequeno palco onde dançava e correu para o brasileiro com um sorriso largo e os braços abertos, ansiosa para o abraço. Aterrorizado, Ahmed gritou!